Um projeto que unia o Governo de Moçambique, a Agência Japonesa de Cooperação Internacional (Jica, em inglês) e a Agência Brasileira de Cooperação (ABC – vinculada ao Ministério das Relações Exteriores) foi enfrentado pelas organizações de camponeses dos três países, a ponto de ser deixado de lado tanto pelo Brasil quanto pelo Japão.
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Chamado ProSavana, o acordo de 2009 previa utilizar uma faixa de terra moçambicana da ordem de 14 milhões de hectares, na área de Nacala (incluindo o Porto), para plantio de grãos voltados à exportação. O projeto seguiria os mesmos moldes do desenvolvimento realizado pelo Brasil na região do Mato Grosso na década de 1970, área hoje dominada pela monocultura de soja. Moçambique cederia as terras, o Brasil, a tecnologia, e o Japão comercializaria os produtos – com a utilização de uma grande ferrovia que corta a região de Nacala, conectando-a ao porto de mesmo nome. As informações são do Le Monde Diplomatique Brasil.
Grandes empresas e dirigentes mundiais elogiaram o projeto, mas os camponeses da região não foram consultados e seriam transformados em trabalhadores no processo de exclusão – em Moçambique, as terras pertencem ao Estado e os moradores tem apenas “direito de uso e exploração da terra”, de acordo com a Constituição do país. A região, ao contrário do Mato Grosso dos anos 1970, é povoada e tem tradição em agricultura familiar, produzindo grande parte dos alimentos consumidos no país.
Os camponeses descobriram que o programa de infraestrutura atrairia grandes empresas em detrimento deles e, ao questionar governo e empresas envolvidas, não obtinham respostas sobre o processo. Foram então ao Brasil, em 2013, para ver como havia sido em Mato Grosso. E descobriram que na região não há camponeses nem habitações. Além disso, um documento das empresas organizadoras do projeto falava em “empurrar os agricultores das práticas tradicionais de cultivo e de gestão das terras para práticas agrícolas intensivas baseadas em sementes comerciais, insumos químicos e títulos fundiários privados”.
O movimento local pela falta de transparência se tornou internacional, com apoio de organizações camponesas do Brasil, do Japão e Internacionais, além de organizações da sociedade civil europeia. Japão foi o primeiro a questionar a viabilidade e o Brasil foi o primeiro a desistir. O ProSavana, então, sob pressão, foi suspenso. Mas não cancelado. O projeto ainda continua em Moçambique, sob os olhos das organizações sociais.