Conexão Lusófona

Perderemos todos

(Imagem: Wilson Dias, Agência Brasil)

 

Ultimamente todo cenário político nacional pode mudar em questão de minutos
Na quinta-feira (14 de abril), às 17h30min (horário brasileiro), quando este texto foi revisado pela última vez, os prognósticos para o julgamento do impeachment, decidido no próximo domingo, eram sombrios para a presidenta Dilma Rousseff. Por se tratar de Brasil, é importante ter esse horário em vista, pois ultimamente todo cenário político nacional pode mudar em questão de minutos. Mas voltemos a Dilma e seu cadafalso.

 

Alheia aos esforços do ex-presidente Lula para salvar o mandato de sua sucessora negociando lotes do governo, a barca do governo vai se esvaziando partido por partido. Principal beneficiado, o PMDB abriu as portas de desembarque. O escorpião picou o sapo. A essa altura do campeonato, o PMDB do vice-presidente Michel Temer já é dos males o mais incurável e, portanto, o menos preocupante. A situação de Dilma se agrava mesmo é com o desembarque das legendas como PP e PSD.

 

Se nem os partidos que mais se beneficiariam da sobrevida de Dilma seguem apostando na sua continuidade, é sinal de que os 172 votos necessários para salvar a presidenta na Câmara dos Deputados estão cada vez mais distantes.

 

Não se trata de um atentado à democracia brasileira, mas é bastante preocupante o efeito de um impeachment ao cenário político brasileiro nas condições em que ele está se desenhando.
O impedimento de Dilma, diferentemente do que muitos analistas opinam, não é um golpe antidemocrático. Pode ser uma rasteira, uma traição, uma tremenda sacanagem conduzida por pilantras da pior espécie – o maior deles, Eduardo Cunha, presidente da Câmara também do PMDB e primeiro homem na linha de sucessão presidencial pós-impeachment –, mas está sendo realizado dentro dos ritos legais por políticos democraticamente eleitos. Eleitos, diga-se, pelos mesmos eleitores de Dilma. Quem votou em Dilma Rousseff, votou também em Michel Temer como o seu vice. Se agora ele toma o poder, é de responsabilidade do PT ter enganado 54 milhões de brasileiros sobre a estabilidade dessa união.

 

Não se trata de um atentado à democracia brasileira, mas é bastante preocupante o efeito de um impeachment ao cenário político brasileiro nas condições em que ele está se desenhando. Preocupante, inclusive, para os partidos da oposição. No sábado passado, o instituto Datafolha divulgou pesquisa sobre uma hipotética corrida eleitoral: em cenários com os dois principais nomes do opositor PSDB, o ex-presidente Lula aparece respectivamente com 21% e 22% das intenções de voto.

 

Incapaz de apresentar um bom nome ao eleitor antes e depois de 2014, o PSDB demonstra miopia ao apoiar o PMDB na sua manobra para tomar um governo sem precisar de votos. Em 2018, esses eleitores voltarão às urnas, e ouvirão dos palanques do PT um discurso perfeito.

 

Diferentemente do que ocorreria caso Dilma permanecesse, o partido não teria mais de defender o seu péssimo governo. Em vez de uma presidenta inventada e incompetente, cercada de corruptos entre seus aliados, Dilma seria pintada como uma injustiçada. Figura sacrificada sem ter cometido crime algum para que a elite voltasse ao poder. E quem se apresentaria para salvar os pobres do Brasil em um cavalo branco? Lula. Este que, mesmo devendo explicações à polícia, é líder em intenções de voto. Imagine em dois anos, depois de tamanha injustiça como um impeachment.

 

Aprender essas lições é o caminho mais longo e mais benéfico ao país. O caminho mais curto e eficiente para o PT voltar à presidência em 2018 é o da bravata.
Em um esforço de otimismo, o PT poderia tirar lições positivas da experiência do impeachment. Poderia aprender que uma eleição não vale a pena ser vencida se o preço é alto demais. Que candidato não se inventa, como Lula inventou Dilma. Que uma coligação mastodôntica de nove partidos, como ocorreu em 2014, se torna volátil quando seus fins são apenas eleitorais. Com esse número de partidos é possível fazer uma campanha eleitoral imensa, passar um verdadeiro longa-metragem nos programas eleitorais de TV, mas nunca viabilizar um projeto de gestão legítimo.

 

Mas aprender essas lições é o caminho mais longo e mais benéfico ao país. O caminho mais curto e eficiente para o PT voltar à presidência em 2018 é o da bravata. E, em se tratando de Lula, a bravata turbinada pela excelente oratória é uma certeza. Uma vez eleito, o PT ganha também um salvo-conduto para a corrupção. Afinal de contas, valerá tudo para que os autoproclamados pais dos pobres jamais deixem o poder novamente.

 

Do outro lado, a oposição precariamente liderada pelo PSDB parece não ter aprendido nada em 2014.

 

Não entendeu que, mais do que uma vitória de Dilma, a eleição passada foi uma derrota de Aécio Neves. Não aprendeu que é preciso dialogar com o eleitor de baixa renda, que precisa buscar um nome capaz de representá-lo. E desde que a classe média tomou as ruas do Brasil com bonecos infláveis de Lula vestido de presidiário, essa distância entre os tucanos e os brasileiros de fora das manifestações só aumentou. Os gritos de “Fora Dilma” são barulhentos, mas a maioria dos brasileiros está calada e cada vez menos se identifica com essa turma.

 

Quem ganha com o impeachment? Por ora, o PMDB. Michel Temer, figura vaidosa e afeita a palavras empoladas, tem a ambição de fazer um governo de “salvação nacional”, conforme discurso ensaiado em frente ao espelho e ao gravador do WhatsApp. Assim como tomou o governo pelo atalho, também tentará escrever seu nome da História por essa via. No mundo real, dificilmente passará de um bom alvo de piadas. Um boneco risível a nos lembrar da cilada em que o PT nos colocou ao convencer o Brasil a elegê-lo e da qual a oposição é incapaz de oferecer rota de fuga.

 

Os que querem salvar Dilma agora para derrotar Cunha e sua turma podem acabar jogando o Brasil junto na água da bacia
E se o impeachment não acontecer? Provavelmente Eduardo Cunha dará procedimento à sessão de tortura de Dilma aceitando um novo processo, na esperança de que a presidenta não tenha sangue o suficiente para aguentar até 2018. Se Dilma suportar até a próxima eleição, o final disputado nas urnas poderá ser mais legítimo e honroso aos livros de História, mas nada indica que ela tenha força política para conduzir o Brasil para fora da crise econômica até lá. Ou seja, os que querem salvar Dilma agora para derrotar Cunha e sua turma podem acabar jogando o Brasil junto na água da bacia.

 

De qualquer forma, o PMDB vence. Quando o PMDB vence, é porque perdemos todos.

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