Acaba já em janeiro do próximo ano o mandato do sul-coreano Ban Ki-Moon enquanto Secretário-Geral das Nações Unidas (ONU), e a corrida à sua sucessão entra na reta final com oito candidatos.
Pela primeira vez na história da instituição, os candidatos estão a dar-se a conhecer aos 193 países-membros e ao mundo, respondendo a uma série de perguntas, de representantes da ONU e do público, em sessões transmitidas em direto via internet.
Quem é o português na corrida e quais as suas propostas?
António Guterres tem 66 anos, nasceu em Lisboa, foi deputado e primeiro-ministro de Portugal entre outubro de 1995 e janeiro de 2002, altura em que pediu demissão na sequência de um desastroso resultado eleitoral nas autárquicas do ano transato.
Conhece intimamente a ONU e os seus meandros por ter exercido durante dez anos, entre 2005 e 2015, o cargo de cargo de Alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados, experiência que lhe pode valer alguns pontos, numa altura em que as migrações de refugiados são um dos temas quentes da agenda de praticamente todos os países.
A grande prioridade de António Guterres é preservar a paz mundial e proteger os mais vulneráveis, sobretudo, as mulheres e as crianças. O candidato crê ainda que temos todos um dever moral de agir contra o terrorismo e não dissocia essa bandeira da luta pela inclusão. Acredita em sociedades coesas e reforça que para que existam tem de se acabar com fenómenos como o racismo, a xenofobia, a islamofobia e o antissemitismo.
Quem são os adversários de António Guterres e o que propõem?
Igor Lukšic (Montenegro)
O mais novo de todos os candidatos tem apenas 39 anos. Igor acumula o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros, da Integração Europeia e de vice-primeiro-ministro de Montenegro. Entre 2004 e 2010 foi ministro das finanças daquele país, mas destacou-se mundialmente aos 34 anos de idade, quando foi eleito primeiro-ministro, tornando-se assim, à data, o primeiro-ministro mais jovem do mundo.
Igor Lukšic crê ser necessário reinventar o multilateralismo para a idade moderna, com base nos princípios da responsabilidade, inclusão e envolvimento, e tornar a ONU mais relevante, eficaz e eficiente, de forma a lidar da melhor forma com os desafios atuais e os que ainda estão por vir.
Srgjan Kerim (Macedónia)
O candidato de 67 anos acumulou, ao longo das últimas duas décadas, vários cargos governativos na Macedónia, de onde é natural, mas também na Federação da Jugoslávia, que se desmembrou no início dos anos 90. Chegou a ser vice-ministro do Negócios Estrangeiros da Jugoslávia entre 1988 e 1991. Posteriormente, foi embaixador da Macedónia e ministro dos Negócios Estrangeiros e presidiu à 62ª Assembleia-Geral da ONU entre 2007 e 2008. É doutorado em Economia. Atualmente, lidera o maior grupo de media do país.
Caso se torne secretário-geral, as suas prioridades são a reforma das Nações Unidas, a segurança, o desenvolvimento sustentável, a igualdade de género, a educação e as questões relacionadas com os migrantes.
Vesna Pusic (Croácia)
É a vice-primeira-ministra da Croácia, cargo que acumula com o de ministra dos Negócios Estrangeiros e Assuntos Europeus. Além de deputada, é também professora de Sociologia e Teoria Política na Universidade de Zagreb. É doutorada em Sociologia pela mesma universidade. Em 1979 fundou uma organização feminista na então Jugoslávia e já escreveu cinco livros, além de ter publicado mais de 50 artigos científicos. Tem 63 anos.
“Talvez seja demasiado pensar que um secretário-geral pode mudar o mundo. Mas ajuda muito se essa pessoa conhecer a realidade do que é um país antes ou durante um conflito” disse, em declarações ao The Independent.
Danilo Türk (Eslovénia)
Danilo Türk tem 64 anos, foi presidente da Eslovénia entre 2007 e 2012 e é, atualmente, professor emérito da Universidade de Liubliana. Doutorado em Direito, foi o responsável por redigir o capítulo de Direitos Humanos da Constituição da Eslovénia, em 1991. Tem estado ligado a ONG’s e colaborou com a Amnistia Internacional na denúncia de violações de direitos humanos na então Jugoslávia.
O professor foi o primeiro esloveno no Conselho de Segurança da ONU e foi eleito secretário-geral assistente para as questões políticas da organização antes de assumir a chefia do Governo da Eslovénia. Foi embaixador da ONU em Nova Iorque, onde desenvolveu um conjunto de atividades com a assembleia-geral.
Caso consiga a nomeação a sua liderança atuará com particular destaque em assuntos políticos, procurando a defesa dos Direitos Humanos, bem como questões de segurança e assistência humanitária.
Irina Bokova (Bulgária)
A atual diretora-geral da UNESCO, a organização da ONU dedicada à Educação, Ciência e Cultura, tem 63 anos. Bokova vai no segundo mandato à frente deste órgão, tendo sido eleita pela primeira vez em 2009. É a primeira mulher e europeia de leste a consegui-lo. Irina foi nomeada vice-ministra dos Negócios Estrangeiros para coordenar as relações da Bulgária com a União Europeia, entre 1995 e 1997.
Desempenhou também o cargo de embaixadora em França e no Mónaco. Tem um mestrado em Relações Internacionais e já foi ministra dos Negócios Estrangeiros da Bulgária. Fez parte de diversas delegações da Bulgária na ONU e também participou na redação da Constituição búlgara.
Irina mostra-se bastante confiante na vitória do ato eleitoral, talvez por ter o apoio da Federação Russa. Promete fazer da igualdade de género uma das suas batalhas, tal como o combate ao racismo e ao terrorismo.
Natalia Gherman (Moldávia)
Foi vice-primeira-ministra da Moldávia, bem como ministra dos Negócios Estrangeiros e da Integração Europeia, até janeiro último, e foi primeira-ministra por um mês entre junho e julho do ano passado. É diplomata de carreira e foi embaixadora moldava em diversos países. Tem um mestrado em Estudos de Guerra do King’s College, na Universidade de Londres. Tem 47 anos e é filha do primeiro presidente da Moldávia, Mircea Snegur.
A questão dos migrantes e do aumento da representatividade feminina nos poderes de decisão serão algumas das suas frentes de batalha.
Helen Clark (Nova Zelândia)
Aos 66 anos é a atual administradora do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), cargo que desempenha desde 2009. Antes disso, foi primeira-ministra da Nova Zelândia durante dez anos. No seu currículo constam ainda outros cargos governamentais, como ministra da Saúde e vice-primeira-ministra, além de deputada.
Helen Clark vê na eleição para o órgão máximo das Nações Unidas a oportunidade para “dar voz a sete mil milhões de pessoas que procuram esperança e apoio”.
Como decorre o processo eleitoral?
Os candidatos propostos ao cargo de secretário-geral são sugeridos pelos governos de cada Estado-membro da ONU. A título de exemplo, Portugal sugeriu António Guterres. Após a proposta de cada país, o Conselho de Segurança da ONU, numa reunião privada, sugere um nome desses candidatos, aos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança (Estados Unidos, Reino Unido, Rússia, China e França).
Caso seja aprovado por estes cinco membros, o escolhido vai a votação na assembleia-geral, onde tem que reunir, pelo menos, 66% dos votos. O secretário-geral é eleito por um período de cinco anos, não havendo nenhum limite de mandatos.
Para além destas regras formais, há ainda que ter em conta as informais. Uma dessas regras “impõe” um sistema de rotação regional. Depois da África e da Ásia é agora esperado que o novo secretário-geral saia, preferencialmente, do leste europeu, o que explica o elevado número de candidatos provenientes dessa região (6 em 8).
Outra regra informal que tem ganho cada vez mais força é a da alternância de género, sendo crível que a ONU escolha pela primeira vez uma mulher para liderar a organização.
Pode acompanhar AQUI as entrevistas dos últimos candidatos.