Mia Couto: “Olhamos para a África com valores europeus”
Em entrevista à Revista Época (Brasil), o autor moçambicano afirmou que o futebol, o Carnaval e outros estereótipos brasileiros serviram como modelos para a África – mas eles se esgotaram.
Segundo o autor, apesar da independência, a descolonização do pensamento em relação aos países lusófonos em África ainda não ocorreu: “Olhamos para a África com valores europeus. É preciso uma ruptura para mudar a situação”. Para Mia Couto, esta mudança deve ser feita pelos próprios africanos, criando um pensamento próprio que ultrapasse a folclorização que a própria África produz para si.
“O Brasil foi um modelo pela via da mistificação. O Brasil nos enganou. Recordo-me quando os primeiros jogadores de futebol negros brasileiros se impuseram ao mundo. Nós, na África, vimos aquilo como nosso futuro, a realização de um sonho: Pelé, Garrincha. Mas não era claro para todos que aquilo era a parte visível de um mundo extremamente racista. A celebração da alegria do Carnaval, a celebração do corpo negro como paradigma da beleza, foi sempre valorizada por nós. Mas víamos um Brasil que não existia. Isso se mantém até hoje. Porque vemos o Brasil com o orgulho de quem vê um membro de nossa família estar à frente, como uma das potências econômicas mundiais. Mas não percebemos as contradições internas que esse sistema tem. Todos precisamos ter um parente rico.”
Para Mia Couto, foi nos tempos de ditadura que a troca de literatura e música entre o Brasil e os países lusófonos africanos foi mais intensa, intercâmbio este que hoje é residual: “Porque agora nos deixamos levar pelo mercado, e o mercado não está interessado em que haja essas trocas. O que conheço da literatura brasileira é por meu esforço”.
O autor avalia ainda de forma posotiva a evolução da literatura em Angola e Moçambique: “Hoje temos nossa produção editorial – cinco editoras – bem instalada. As livrarias se disseminam em muitas cidades. A escola adotou os escritores nacionais. A África lusófona está à frente da África de línguas inglesa e francesa. No Zimbábue e na África do Sul, as escolas ensinam só autores ingleses. No caso de Angola, os escritores nacionais são colocados em primeiro plano, desde a escola primária. Isso cria uma relação de intimidade que ajuda a literatura. E isso começa com a escola”.
Para ler a entrevista completa, clica aqui.
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