Conheça os Xerentes: Os Anfitriões dos Jogos Mundiais Indígenas 2015
(Imagem: Lídia Barroso)
Quem for participar ou simplesmente assistir aos Jogos Mundiais Indígenas que acontecem este ano na cidade de Palmas, capital do estado do Tocantins, no Brasil, será recebido pela nação Xerente, ou Akwē, e é interessante saber de antemão um pouco sobre eles.
Primeiro, se você fala o português, fique tranquilo. Os Xerentes falam muito bem o português, mesmo sendo esta a sua segunda língua, pois já estão em contato com os brancos a cerca de trezentos anos. E, prepare o bolso, pois ficará encantado com o artesanato deste povo, que fabrica lindos objetos trançados, tanto em palha de babaçu, quanto do já famoso capim dourado que só existe no Tocantins. Depois, prepare-se para longas conversas, pois os Xerentes adoram conversar com estrangeiros, são alegres e muito brincalhões.
Mas, se você vai competir ou simplesmente torcer então preste muita atenção nos Xerentes, pois eles representam a “seleção brasileira” dos jogos indígenas. Bons de bola mantêm campos de futebol em quase todas as suas 69 aldeias e sua delegação é a mais forte esperança do Brasil na modalidade. Mas não só. São também tradicionais competidores e vencedores em diversas modalidades das competições indígenas nacionais no passado recente dos jogos, principalmente em canoagem, corridas de tora e da competição com arco e flecha.
O esporte para este povo representa um estilo de vida que os permite conservar sua natureza competidora, testando cotidianamente sua coragem e garantindo a saúde e felicidade em suas aldeias. Por isso, todos participam inclusive mulheres e crianças. Aliás, a infância Xerente é muito invejada pelas crianças brancas. As crianças Xerentes além de lindas são criadas com toda a liberdade para brincar quando quiserem inclusive quando estão em uma das 31 escolas mantidas pelo Estado brasileiro nos arredores de suas aldeias.
História
Os Xerentes são os Akwē, que na língua deles significa “indivíduo”, também sinônimo de “gente importante”. As pesquisas antropológicas indicam que eles chegaram no Tocantins, provavelmente migrando das terras secas da região Nordeste, do Brasil, onde encontraram abundancia de água. Os primeiros contatos com os brancos datam de 1738, quando já haviam se estabelecido na região Norte do Brasil nos arredores dos rios Tocantins e Araguaia.
Quem nos conta um pouco da história dos primeiros tempos de relacionamento com os não índios é a antropóloga e Assessora Indígena e da Diversidade do Tocantins (SEDUC), Dra. Lídia Soraya Liberato Barroso:
“Entre guerras com os “não índios” que chegavam à busca de ouro, abundante na região, entre os séculos XVIII e XIX, a escravidão e doenças; a população Akwē diminuía a cada ano. Uma comitiva de índios Akwē então viajou para o Rio de Janeiro e procurou os governantes com o pedido do povo para construir um aldeamento. Em 1840, o Padre Franciscano Frei, Antônio de Gange, chega da Itália com a missão de fundar o aldeamento de Tereza Cristina, para os índios Xerente, que se estabeleceram do lado direito do rio Tocantins, cidade de Tocantínia, onde estão até hoje”.
Suas terras, no entanto, só foram demarcadas com garantida da posse indígena oficialmente em 1989. O território Xerente localiza-se no Estado do Tocantins, na parte leste do rio Tocantins, a 70 km ao norte da capital, Palmas. Faz limites com as cidades de Pedro Afonso, Rio do Sono, Aparecida do Rio Negro e Lajeado. Suas aldeias estão localizadas na margem direita do rio Tocantins, numa área demarcada na extensão de 183.542 hectares.
No final dos anos 80, com a criação pela federação brasileira do estado do Tocantins passam a conviver com a população urbana das cidades de Tocantínia, Miracema do Norte e a capital, Palmas, onde muitos Xerentes são inclusive, comerciantes e trabalhadores em geral, participando ativamente da vida urbana. Daí para cá, a população tem crescido e hoje somam três mil e 600 indivíduos vivendo nas aldeias e nas cidades do entorno de suas terras.
Cultura
Nas palavras do etnólogo alemão, Nimuendaju, assim nomeado pela tribo dos Guarani-Ñandeva em 1906 e que significa “fazer moradia”, conseguimos uma melhor apreensão da cultura Xerente, povo com o qual também conviveu. Diz o etnólogo em 1942: “Para o Akwē está reservada à tarefa de organizar o mundo. Isso inclui a organização social que é dualista, onde uma deve se opor a outra para dar equilíbrio ao cosmos. As metades estão divididas em seis clãs. Os clãs unidos tomam conta da natureza e assim o Akwē tem autorização do Sol e da Lua para ser o senhor do mundo, mas para conhecer qual o seu papel no mundo o Akwē deve encontrar o seu ĩkrda – aquele que tem permissão do sol e da lua”.
A antropóloga, Lídia Soraya Liberato Barroso, complementa as palavras de Nimuendaju explicando que a metade que está associada à autorização da lua, se chama Sdakrã e está ao norte de suas terras; e a metade autorizada pelo sol, Sptato, está ao sul. Os clãs são chamados de partidos pelos Xerentes e abrigam várias aldeias.
Os Xerentes pertencem ao grupo linguístico Macro-Jê e sua língua-mãe é o Akuwen. Quando em idade pré-escolar são monolíngues, mas aprendem o português nas escolas que mantêm um ensino diferenciado para os indígenas incluindo sua cultura nos conteúdos educativos, o que rapidamente os transformou em povo bilíngue. “Eles juntam tudo que aprenderam com as comunidades vizinhas e retomam suas vidas com consciência e respeito a sua história”, explica a antropóloga.
Com isso, mesmo nos dias atuais em convívio direto com a sociedade envolvente, preservam sua língua. “A utilização da língua é parte muito importante da luta pela sobrevivência e resistência de um povo, é um forte elemento da cultura que os une e de certa forma os protege”, complementa Lídia Barroso.
A sobrevivência dos Xerentes nas aldeias é toda retirada da natureza. Da terra, da mata, dos rios e córregos. Sua agricultura é de subsistência, a chamada “Roça de Toco”. Entre os principais alimentos cultivados estão o milho, a mandioca, abóbora e o amendoim. Sua arte é artesanal e varia entre instrumentos musicais e armas, produzidos artesanalmente com madeira, colares e enfeites confeccionados com sementes e utilitários com pinturas.
O especial destaque está nas peças confeccionadas com capim dourado que já virou referência do Tocantins a nível nacional. Apesar dessas peças serem fabricadas em larga escala pelo Quilombo de Mumbuca, no Jalapão, muitos estudos mostram que foram os Xerentes que ensinaram os Quilombos a fabricá-las.
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