Não será novidade para si que a poluição é um flagelo, capaz de gerar grandes repercussões no meio ambiental. Quando falamos de poluição de plásticos temos assunto para debater durante anos (e anos-luz). Alguma vez parou para pensar na composição do plástico? Este é um elemento orgânico de polímetros sintéticos, produzido a partir do petróleo, servindo de matéria-prima para a produção dos mais variados objetos. Faça este exercício connosco: olhe para o que tem vestido e para o que o rodeia e tente descobrir alguma coisa que não derive do plástico. Conseguiu? Pois…quase tudo tem, no seu ADN, plástico. Este material possui uma durabilidade elevada e é muito barato. Contudo, acarreta consigo elevados riscos ambientais e os oceanos são as vítimas que mais têm sofrido com este produto. Segundo os estudos realizados pela comunidade científica que analisa este fenómeno global, são lançados anualmente para o mar mais de oito milhões de toneladas de lixo plástico e derivados. Estamos a plastificar os oceanos e não só: o solo também é mártir deste cenário. Anualmente, segundo dados divulgados pela ONU, mais de 400 milhões de toneladas de plásticos são produzidos; apenas 9% são reciclados.
Para fazer frente a esta realidade, a comunidade científica tem unido esforços em prol de soluções viáveis e as descobertas têm sido surpreendentes. Elenquemos algumas.
A lagarta que devora plástico
O que pode ser considerado lixo e inútil para nós é um autêntico banquete para as lagartas. Uma equipa de investigadores da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, descobriu que a espécie Galleria mellonella, comummente conhecida por traça-da-cera, além de se deliciar com o mel e com a cera das abelhas, também aprecia plástico. O mais impressionante é que estes bichinhos, repelidos por muitos, devoram polietileno – um dos materiais plásticos mais resistentes, utilizado na produção dos sacos plastificados das compras.
Algumas experiências realizadas mostraram que este inseto pode romper as ligações químicas do plástico, de forma semelhante à digestão que fazem da cera das abelhas. Esta pequena lagarta, normalmente utilizada como isco para pescar peixes, pode ser considerada a nova heroína ambiental enquanto enche a barriga. Tudo acontece muito rapidamente: 100 lagartas foram colocadas num saco de plástico e, ao fim de 40 minutos, já existiam buracos consideráveis. Ao final de 12 horas, o saco de plástico tinha menos 92 miligramas.
Esta traça-da-cera (e agora traça-do-plástico) encontra-se espalhada por toda a Europa. Tem um aspeto de lagarta durante seis a sete semanas e cresce a uma temperatura de 28 a 34 graus Celsius. Durante a sua primeira fase de crescimento, precisa de comer muito para, depois, transformar-se em traça. Além de cera e mel, passou a devorar plástico, antes de se fechar no seu casulo.
Por ano, cerca de 80 milhões de toneladas de polietileno são produzidas no mundo. Este tipo de plástico demora cerca de 50 anos para se decompor na natureza. Graças a esta descoberta, a poluição de plásticos pode ser combatida, no futuro, com a ajuda destes seres vivos. Se forem precisos reforços, a traça-indiana-da-farinha (Plodia interpunctella) pode ajudar: esta também destrói plástico, mas, ao contrário da lagarta da traça-da-cera, demora semanas a comer o polietileno dos sacos.
Se quiser saber mais sobre esta investigação, pode consultar os resultados publicados na revista Current Biology.
Os cogumelos que decompõem plástico e produzem biocombustível
Aspergillus tubingensis diz-lhe alguma coisa? Bem, este nome difícil de pronunciar pertence a uma espécie de cogumelos com uma particularidade única: é capaz de decompor plástico. Mais uma vez, a solução para combater a poluição dos resíduos plásticos pode estar na própria natureza. Esta descoberta foi realizada pelos cientistas dos Reais Jardins Botânicos de Kew (Royal Botanic Gardens Kew), no Reino Unido, e, apesar dos estudos ainda estarem numa fase muito inicial, já foi elaborado um relatório – State of World’s fungi – que compila toda a informação sobre cogumelos. Neste documento, podemos saber mais sobre as funções, as mais-valias e as ameaças que estas espécies representam para o ecossistema terrestre.
Segundo o estudo divulgado, estes cogumelos têm uma dimensão similar à de pequenos tomates. Em poucas semanas, foram capazes de decompor um tipo de plástico muito utilizado no isolamento de arcas congeladoras e couro sintético: chama-se polyester polyurethane. Este material demora anos a decompor-se e este processo pode ser acelerado com a ajuda da espécie Aspergillus tubingensis. A junção de nomes pode soar estranha, mas, na verdade, pode ser a salvação do planeta, se for bem desenvolvida pelos cientistas.
Além de serem capazes de decompor o plástico, existem outras espécies de cogumelos com propriedades medicinais e nutricionais. Outros são capazes de produzir novos tipos de biocombustíveis e de fabricar papel. Trichoderma é o nome do cogumelo que consegue produzir bioetanol – um biocombustível “de segunda geração”, explicou Ester Gaya, investigadora envolvida na elaboração do relatório. Esta espécie está apta para decompor os resíduos de celulose – popularmente conhecidos como resíduos da agricultura ou biomassa – em açúcares, fermentados pela levedura em etanol. Este combustível também pode ser produzido a partir da cana-de-açúcar ou do milho.
Já existem carros elétricos alimentados por células a combustível de etanol e essa indústria será a responsável por manter vivo o interesse na produção de bioetanol. Deste modo, o potencial dos cogumelos pode elevar-se além-fronteiras gastronómicas. Estes fungos podem ser utilizados na produção de combustíveis sustentáveis e são eficazes na decomposição dos plásticos e seus derivados.
A bactéria que produz uma enzima capaz de destruir garrafas de plástico
Decorria o ano de 2016, quando um grupo de cientistas descobriu em Sakai, no Japão, uma bactéria que vivia nos sedimentos de um centro de reciclagem de garrafas de plástico. Até aqui, tudo normal, tirando a parte de estarmos a falar de bactérias. Vamos ao que interessa. A Ideonella sakaiensis, nome do tal microrganismo descoberto, tinha um poder especial: digeria o plástico das garrafas, usando-o como principal fonte de energia. Fazia-o produzindo uma enzima – substância orgânica -, que os investigadores da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido, decidiram estudar mais detalhadamente. Depois de a analisarem em laboratório, modificaram-na e batizaram-na como PETase. Estes novos ajustes científicos possibilitaram a esta enzima digerir politereftalato de etileno (PET): um plástico duro que, adivinhe só, demora anos a degradar-se na natureza.
Os investigadores descobriram que a estrutura da enzima era muito semelhante à de outras bactérias, quando estas tentavam digerir cutina – o polímero que é a componente principal da cutícula das folhas das plantas terrestres. Enquanto manipulavam a substância orgânica, através de algumas experiências e ao ajustarem alguns resíduos na sua superfície, perceberam que melhoraram acidentalmente a sua capacidade de digerir plásticos PET.
Os resultados desta investigação foram publicados na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS). No artigo, os cientistas explicam que esta enzima consegue decompor o politereftalato de etileno (mais concretamente, uma folha fina deste material) em apenas seis semanas. Na natureza, esta mesma quantidade de resíduos demoraria cerca de um século a desaparecer completamente. Graças a esta substância “mutante” a decomposição de resíduos plásticos poderá ser substancialmente acelerada.