A cidade tem quase tudo o que é necessário: escola, hospital, correio, padaria, fábricas, cinema, cemitério, prisão, edifícios públicos e casas. Mas não tem o essencial — pessoas. São Martinho dos Tigres, uma ilha a 10 km da costa sudoeste de Angola — próxima à Namíbia — é uma verdadeira cidade fantasma desde que os seus habitantes a abandonaram, em 1975, durante a guerra civil angolana. Mas a beleza desértica continua ali.
Antes, unida ao continente por um istmo — pelo qual começou a passar inclusive água encanada — a ilha era uma península. Assim, transportes, mantimentos, médicos, tudo se deslocava melhor. Uma grande tempestade levou a areia dali, deixando a ilha separada do continente pela Baía dos Tigres. O isolamento já dificultava a estadia dos moradores. O nome “Baía dos Tigres”, só por curiosidades, é dado não pela presença do animal, mas pelas faixas em areia amarela e preta que podem ser vistas a partir da ilha.
A cidade, que foi fundada em 1865 e já teve 1550 moradores na década de 1960, era baseada na pesca e no fabrico de enlatados, uma fórmula fácil tendo em vista a grande quantidade de animais marinhos atraída pelas águas quentes. Os portugueses que ali moravam detinham as fábricas e, assim que voltaram a Portugal em 1975, toda a produção local cessou. A sobrevivência se tornou impraticável e a população se foi.
Os planos para a ilha foram vários desde então. Em 2002, planejava-se fazer ali uma prisão. Em 2004, pensou-se em um grande casino, onde as apostas poderiam ser várias, ou então um resort de luxo. Em 2009, um porto de pesca. Mas nenhuma das ideias vingaram. Mais recentemente, cresce a ideia de turismo na região. Será que esta vinga?
Hoje são raras as visitas à ilha, que não tem condições de pernoite e muito menos infraestrutura habitacional. Alguns barcos da região vão ao local, mas levam poucos e raros turistas naquele que já foi um importante polo de pesca angolano.
A cidade
As cores dos prédios públicos, da igreja e mesmo de algumas casas ainda podem ser vistas de leve em alguns pontos — em meio às cores cinzas do cimento dos prédios abandonados. Uma cidade colorida de rosa, azul, amarelo construída com arquitetura tipicamente colonial portuguesa é possível de se imaginar. E mesmo ver.
As casas que ainda restam eram dos ricos e poderosos da ilha. Grandes, espaçosas, com vãos sob elas para que a passagem da areia trazida pelo vento não soterre as construções. A dos pobres — grande parte pescadores e trabalhadores das fábricas — já há muito estão soterradas.
Objetos na ilha — assim como a vegetação — são poucos, a maioria foi saqueada ou já desapareceu no tempo. Há livros na escola. Algumas cadeiras num dos prédios. E não muito mais que isso. A Igreja foi saqueada há muito. Até seu sino foi levado e provavelmente vendido como metal qualquer.
A Ilha é rica em história, mas precisa agora de investimento público para o seu desenvolvimento. Um estudo iniciado pelo governo da província em 1999 começou a desenhar uma solução, mas não havia financiamento o suficiente para dar continuidade ao projeto. Ainda hoje a cidade está no isolamento.