A cada 9 minutos é assassinada uma pessoa no Brasil
No Brasil, em 2017, mais de 63 mil pessoas foram assassinadas. Portanto, além do assunto ser sério, os números também o são. Para interpretá-los integralmente, com a atenção que merecem, podemos desconstruir o primeiro dado estatístico em muitos outros – que tornam toda a questão mais clara e, consequentemente, colocam em maior evidência a verdadeira dimensão deste flagelo. Nestes registos de assassinato, divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, estão incluídos os homicídios com intenção de matar, as mortes originadas por assaltos e roubos, lesões corporais seguidas de morte, agentes policiais mortos e mortes causadas por intervenção de forças da autoridade.
Vamos a contas: se 63 mil pessoas foram assassinadas num período de 365 dias, são 175 mortes por dia; é como se, todos os dias, um avião da Ryanair praticamente cheio, só com 22 lugares comerciais vagos, se despenhasse e morressem todos os passageiros a bordo. Para transportar os corpos que surgem diariamente seriam necessários, mais ou menos, três autocarros inteiros. No final de cada semana, passados sete dias, teriam sido utilizados 21 autocarros para transportar toda a gente que foi violentamente assassinada no Brasil.
Por hora, as contas equivalem a sete assassinatos. Isso significa que, enquanto tiramos a pausa do trabalho para ir almoçar, sete pessoas são assassinadas. Podemos ir mais longe: se uma hora tem 60 minutos, isso é o mesmo que dizer que, no Brasil, a cada 9 minutos, morre alguém devido à violência.
Nove minutos são menos do que aqueles que esperamos pela comida na maioria dos restaurantes; são menos do que aqueles que dedicamos a uma chamada telefónica rotineira com a nossa mãe; são, basicamente, os minutos que levamos para lavar os dentes de manhã.
Olhe para o seu relógio e conte.
Deixe passar 9 minutos.
Uma pessoa foi violentamente assassinada.
Agora deixe passar mais 9.
Morreu outra.
A cada parcela de 9 minutos que passar, surge mais um cadáver para a contagem.
Pela primeira vez na história do Brasil, desde que o levantamento destes dados existe, pode dizer-se que morrem 30 pessoas assassinadas a cada 100 mil habitantes. Significa que 0,03% da população acaba morta por meio da violência no país. Os locais de maior relevância nesta contagem, onde se registam os maiores números de assassinatos por cada 100 mil habitantes, são os estados de Ceará, Rio Grande do Norte e Acre; as vítimas, na sua maioria, têm entre os 15 e os 29 anos de idade, residem nas periferias e são pardos ou negros.
Em 2014, segundo o Anuário de Segurança Pública, as mortes por causas violentas, no Brasil, foram 58.559, sendo que no ano seguinte baixaram em (apenas) 176 registos. Contudo, a partir de 2016 – e atingindo o “pico” em 2017 – os valores subiram substancialmente. Se compararmos o ano de 2014 com o de 2016, onde já é possível verificar uma diferença nos registos, observamos uma subida de 3038 mortes. A diferença acentua-se no ano de 2017, no qual se registaram 5321 mortes a mais do que em 2014 (no total, foram 63.880).
É importante referir que, segundo o Anuário de Segurança Pública, em 2017, as mortes causadas por agentes policiais aumentou em 20%, sendo que o homicídios desses agentes diminuiu em 4,9%. Este facto evidencia que o acréscimo da violência policial não tem sido um fator relevante para baixar os registos de assassinatos no país ou contrariar as tendências violentas. Aparentemente, acontece exatamente o oposto. O aumento do crime organizado e os feminicídios – que foram 1133 só em 2017 – são outros dois fatores de grande influência para este crescimento numérico de assassinatos no país.
Banalização, não!
Não podemos cair no erro de banalizar os números. Para ajudar a perceber o que estas estatísticas significam, talvez seja necessária a perspetiva europeia, australiana e, até, a americana.
Segundo o Atlas da Violência 2018, um estudo realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com o Instituto de Pesquisa Económica Aplicada, o número de homicídios, no Brasil, é 30 vezes maior do que na Europa. Quanto à Austrália e aos Estados Unidos da América, a taxa brasileira é, também, 30 vezes superior quando comparada com a australiana (onde uma em cada 100 mil pessoas é assassinada) e cinco vezes maior quando comparada com a estadunidense (onde cerca de cinco em cada 100 mil pessoas são assassinadas).
Num país em que, na última década, mais de meio milhão de pessoas perdeu a vida devido à violência – e onde os jovens são as principais vítimas – temos que perguntar: que futuro, Brasil?
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